quem conta um conto aumenta um ponto
e mais não digo ....



Folia de Reis





Afeto distraído, feito sorriso de criança banguela é presente. Acontece igual a brincadeira. Da inocência de olhos cúmplices. Sem metas. É conto de asas. Livre da algema da estória. É acontecimento e não fato. E pode durar infinitamente. Tenho a impressão de que os homens e mulheres que abdicam do final feliz vivem a imensidão, de todos os dias contentes.
A propósito é fatigante ver personagens em busca de enredos prontos, aonde pouco se vive e muito se planeja contar aos netos ou à si próprio. Entrega não necessariamente é atirar-se de pés descalços em buracos , cuja profundidade se desconhece. Pode ser ainda mais sentir o arrepio dos pés, na hora do mergulho interior.

Já disse outrora que sou batucada intermitente e por isso não caibo no Carnaval. Essa "folia" espremida num calendário cristão sempre me soa um pouco triste. Curta. Pequena no exagero daqueles que atentam contra si próprios e contra iguais em rituais de pseudo-exorcização das infelicidades padrões. Nada contra o samba. A batucada. Ao contrário o ronco da cuíca me tira fácil para rodar a saia de chita e sair por aí girando. Também nunca careci de permissão institucionalizada em calendário para desfilar as belezas da minha pele sem a máscara da roupa, nas avenidas da minha vida. Folia de rainha é aquela que acontece na hora exata do desejo de sacudir as ancas. Não sei ao certo o que se passa, mas fico meio perdida no Carnaval. Sou um ser sonoro, sinestésico também. Ouvir marchinhas antigas por exemplo me dá um tesão. Penso, no entanto, que os fenômenos de massa, geralmente, são surdos. Pular os limites da própria ignorância deve ser tão mais divertido.
Epa! Não quero brochar ninguém, até proque amanhã olha eu lá no sambódromo. Sacudindo poeiras. Posso ouvir o ronco da cuica nas mãos do meu bem, encher uma cama vazia de confetes imaginários e dormir abraçada com meu melhor sorriso, que guardarei para me ofertar de manhã na quarta-feira de cinzas. Tanto faz. Eu e você, cada um de nós é a festa. E talvez por isso todo casal devesse ser naturalmente pura alegria. União de duas folias, numa maior ainda. Pena que não acontece assim, geralmente, nos sambas canções coletivos.