quem conta um conto aumenta um ponto
e mais não digo ....



VESTÍGIOS DA INGENUIDADE


foto de Luis Ferreira





A apatia tem ameaçado meus dias. Pense no tanto faz ao invés do ideal tudo bem. Sempre tive medo do morno. Prefiro a fogueira. Posto isto, disfarço bem. Não estou totalmente convicta de algumas tristes impressões. Talvez porque o óbvio ainda me entristeça. Em busca de alguma redenção corro ao teatro, vou ao encontro de um espetáculo do FEVERESTIVAL, num local, que por ironia tem o sugestivo nome “Espaço Semente”. Penso no que já floresceu em mim e naquilo que há afinal para brotar. No gargarejo, recebo na cara e sem aviso a sentença: “Toda vida tem amor, saudade e guerra”.
A linda frase faz parte da dramaturgia do espetáculo “Donzela Guerreira”, da Cia Mundurodá. E lá vinha mais: “derrubo meus olhos no chão sem medo no coração, porque sei que, as vezes, a noite cai de luto, mas o dia amanhece quando eu peço”.
Os atores e bailarinos Juliana Pardo e Alicio Amaral encantam pela simplicidade majestosa de cada ação cênica. Foi dentro do Festival Internacional de Teatro de Campinas.
A história, permeada pelo infindo universo das tradições populares brasileiras, é uma homenagem às mulheres guerreiras, ilustres ou anônimas representadas por uma jovem, que se disfarça de homem na tentativa de vingar a morte do pai e combater na guerra. As noites de moça Bonita (lua cheia), no rude cenário sertanejo, viram palco da paixão do "soldado" pelo capitão e vice-versa, num enredo de querência e estranhamento. Cuidadosamente, os dois representam toda a sutileza dos amores, que transcendem ao sexo,por um motivo ou por outros - a revelia, inclusive, de irrefreáveis desejos. Corpo e alma dos atores e da platéia viram uma mesma amálgama, no balé da busca de entendimento da vida. No fim, os seios da mulher amada só se revelam ao capitão quando frios, ceifados pela morte. Mas a tristeza não encerra a história "inventada", como julgam os viventes do causo. Os atores terminam a montagem recapitulando a vida, sapateando sobre as his e estórias, numa bela metáfora da eternidade. Se este espetáculo passar perto de você, não perca.

GLOSSÁRIO SERTANEJO:

Moça bonita – lua cheia

Campo maior – céu

Boca miúda – estrela

Homi carrancudo - Sol


Em tempo: Em Campinas artistas que se empenham em comunicar a arte ao invés de inventar artifícios para fulgazes aparições se unem em prol de um teatro redentor, sem puritanismos, nem putaria. Todos os anos dezenas de jovens operários das artes cênicas pegam seus diplomas da aclamada Unicamp. E muitos usam tal status para fazer a diferença e atuar em prol da cidadania e da cultura. Tem aqueles que chegam de outra direção também, com vivências não menos importantes para engrossar este "caldo cultural ". Entre os grupos mais expressivos da cidade figuram o Lume Teatro e O Barracão. Meus parabéns à todas as donzelas e moçoilos guerreiros desta senda ...... E VIVA O TEATRO...SEMPRE!!!!!!